domingo, 28 de julho de 2013



Segurou os olhos com força. Não podia acompanha-lo, caso o fizesse ficaria claramente constrangida. Esse era o seu problema; uma vergonha sem pudores que não lhe abria exceções. Era só falar em público que as mãos pareciam derreter, frias como recém falecidos e os olhos afundavam em olheiras sem fundo.

Precisava de um tratamento violento, com aparições no palco, dedicações ao microfone. Era isso, ou o silêncio quando ele enfim se aproximasse. Não podia perder essa chance quando ela chegasse.

Cumpri minha palavra, gritei seu nome logo na entrada, para que soubessem quem era ela. Ela começou a nutrir certa intolerância, mas depois me agradeceria, quando curada desse mau comportamento.

Deixei cair o prato no refeitório para que todos os olhos se projetassem nela. E a fiz gostar pouco a pouco da plateia. Ficava cada vez menos vermelho o rosto, um rosa escuro, talvez. Visivelmente o tratamento começou a fazer efeito.
Não acompanhava mais o aspirante a médico. Passou a acompanhar o que lhe passasse a vista, moreno ou loiro.
Foi assim que a curei da timidez severa, com holofotes, gritaria e com eficácia garantida.


Não sabia por onde começar. Ela tirava adjetivos de onde ninguém havia visto.

Para o imenso nariz, destacava-lhe o olfato. Sentia e sabia todos os perfumes dela. Mesmo depois de uma cirurgia que prometia corrigir o desvio de septo era impossível  não notá-lo a priori.

Ela o ameaçava com a beleza fina dos longos cabelos loiros, com os olhos esverdeadamente azuis ou azuladamente verdes. Eu dizia o quanto assustavam no as investidas. Toda delicadeza lhe caia em tom de maldade, judiaria. 

Nem nos sonhos aquele homem pequeno do nariz grande poderia pensar nas tentativas dela de ser clara.Ela por sua vez, com os adventos da modernidade, perseguia todas as fotos, foi assim que conseguiu ver sua natureza mais antiga, antes dos procedimentos cirúrgicos.
Como levar adiante um relacionamento desproporcional no quesito beleza? Em todos os outros podia se equivaler, mas esse...nunca. 

Ele treinava mostrar seu troféu aos amigos. Ela desfiava elogios e o chamava tão carinhosamente de feio que até bonito ficava na descrição mais eufemista possível.
No dia, de encontro marcado, decidiram se enfiar no lugar mais escondido onde ninguém faria comparações ou medidas, mas quando todos deram falta de ambos, ficou claro o motivo.
Combinaram a separação, cada um para um lado a fim de disfarçar. Mas o resumo da história chegou ao fim e não sou mais eu dona dela.