De repente secaram as bicas. Primeiro as torneiras da
cozinha, depois, o banho só se fazia de mar. A princípio ninguém se ateve a
esse detalhe, todos contavam com a expectativa da água voltar no final do dia a
encher as caixas d´água. Para imensa surpresa, a água não encheu os canos, nem
mesmo a chuva inundou o céu.
O noticiário foi impedido de contar o trágico fato para
controlar o desespero. A boca seca causava certo mal estar, entretanto, as
reclamações eram pequenas em relação à grandeza do problema e isso censurava
qualquer palavra por enquanto.
Os engenheiros puseram-se a pensar em alguma solução. Os
químicos pensaram no dinheiro capaz de ser gerado com oxigênio e dois
hidrogênios, mas um conselho de ética limitou a ganância contida nos jalecos.
Após todas as opções se esgotarem e até o mar diminuir de
volume, uma ideia cresceu no vazio. Diante da amargura de uma vida seca, milhões
choraram de tristeza. Cada gotinha preciosa que caía, evaporava ao tocar os
lábios secos. Devido à extrema necessidade, as lágrimas passaram a valer muito.
Lotaram salas de cinema com filmes de Titanic e horrores do
holocausto. As lágrimas escorriam num recipiente onde eram coletadas. Crianças
recebiam susto para abrirem o berreiro. Testaram as bombas de gás lacrimogênio,
porém, certa substância tornava a lágrima imprópria e as autoridades viram que
teriam que buscar outras alternativas ainda mais eficazes.
Passaram-se alguns meses, e a população fazia rodízio no
apanhador de lágrimas. Aos poucos, cada lágrima lançada era mais escassa. O
costume seca, como uma vacina que previne das mazelas. As matanças não surtiam
mais efeito, os amores não emocionavam mais. Apáticos, um exército de olhos esgotados
olhavam para o horizonte, onde quer que ele fosse, sem uma direção. A tristeza
não causava mais efeito.
Um homem ousou expor
uma nova tentativa, fez o reverso de tudo já visto. Lançou mão do seu jeito
abobalhado e se debruçou no primeiro menino que viu, fazendo uma graça. O
efeito foi imediato. Riu, e rindo via-se brotar dos olhinhos pequenos duas
gotas da mais salgada lágrima, ainda mais preciosa.
De tanto sofrerem, sem enxergar saída, ao se depararem com a
risada que rompia com o sisudo silêncio de quem perde as esperanças, ocorreu o
imprevisível. Como se alguém tivesse acabado de contar uma piada infalível,
todos começaram a rir e os cachorros latiram em alguma concordância. As
lágrimas voltaram a ser suficientes para hidratar os corpos já enrugados.
De fato, dias depois, os mais importantes perceberam que
fazer rir era muito mais difícil que fazer chorar. Os melhores comediantes
foram requisitados em auditórios para fazer chorar de rir, esses também sorriam,
pois, haviam dado adeus ao desemprego que passaram por aqueles meses atrás.
De um dia para o outro, da mesma forma que alguém secara a
água, derrubou um temporal sobre o chão, a encher as folhas murchas de cada
plantinha, como se alguém houvesse simplesmente esquecido de molhá-las.
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