sábado, 17 de janeiro de 2009

Tinha mãos de mímico, falando mais que a própria boca em inquietação constante.

Os gestos argumentavam. Cada dedo tinha alguma razão. Apontava o indicador como se fosse uma arma, mas o gerente nada pode fazer por ele.

O restaurante cheio o interrogava com olhos que não cabiam nas órbitas. Saiu de lá chutando os canteiros, amontoando as notas do cartão de crédito no bolso, deixando cair metade dos outros comprovantes.

O caminho de casa pareceu mais longo aquela tarde. Todos os sinais de trânsito fechavam contra seu favor. Alguma força estranha desafiava sua paciência que já era pouca.

Logo que o nervosismo cessou, tratou de esticar as pernas sobre a poltrona, para o sangue voltar ao lugar certo. Ponderou as tragadas de cigarro para que nenhum vizinho viesse até a porta reclamando do cheiro forte que o cigarro produzia, assim como houve antes no salão repleto de cadeiras ocupadas no restaurante.

Jurou que nunca voltaria. Logo repensou sua promessa pelo salmão que o viciara. Teve vontade de processar o estabelecimento por incentivar o vício, com letras escritas em giz amarelo anunciando “Temos salmão com alcaparras”. Talvez ganhasse muito dinheiro fazendo isso. Mal possuía dinheiro para comer lá, que dirá pagar um advogado. Teve que pendurar esta idéia também.

De tantas idéias aposentadas havia horas em que preferiria ser uma ostra, filtrando uma água bem imunda. Torceu pela outra encarnação ser mais generosa. Pediu ainda forças para resistir ao salmão. Tudo para não olhar para aquele gerente entupido de deselegância.

Por aquele momento queria guardar o silêncio penetrando na cabeça cheia de contas. Fechava os olhos tentando cochilar. O sono não vinha. A preguiça não deixaria levantar sequer uma perna até a esquina para comprar outro maço de cigarros baratos. Sua vida pendeu sobre o estofado azul gasto pela gata da ex mulher que puxava todos os fios ao acordar; e ela acordava várias vezes ao dia..

5 comentários:

grupo gauche disse...

poxa, que bacana. gostei muito mais muito mesmo desse texto! um abraço pra vcs

Andrew Rosário disse...

muito profundo...
parabéns!

Anônimo disse...

Retratando um cotidiano... hummm.. bem interessante!
Parabéns ;*

Airton disse...

opaa texto bunito...blog ta legal... bom ter um blog cum ajuda neh...heheh

Cássia disse...

não tenho mais ajuda, todos os textos aqui escritos são meus