domingo, 14 de outubro de 2007

As orelhas implantadas pelo corpo não me assustam mais. Leio o jornal pela internet, às vezes sinto saudade de tocar o papel e ficar com a sensação de que meus dedos estão sujos.

As notícias se repetem. As imagens possuem mais importância que o ínfimo texto. Basta passar os olhos pelas fotos e já dá para deduzir tudo.

Canso de ficar sentada exercitando os olhos e vou para rua. Alugo um cachorro alheio para me fazer companhia. Paro para tomar água de coco até que um homem estende o braço e diz ser por sua conta. Achei estranho, normalmente se paga por martine, caipirinha e cerveja escura. Tive vergonha de recusar a oferenda, peguei o canudo e fui sentar no banco adiante. Ele veio trazendo outro coco, já se apresentando.

Ficamos conversando e quando vi estava mostrando os pulsos e cruzando as pernas em sua direção. Era um bom e um mau sinal.

Não sabia o que fazer. Encontramos-nos com freqüência depois daquele dia. Havia um problema; ele era feio. Não sabia onde esconder aquele nariz gigante, a risada eufórica que me constrangia, tinha vergonha de dizer que era ele.

Inventei uma desculpa e o levei para o salão com a intenção de domesticar aqueles cachos. Nada dava jeito, tive que passar formol. Evitava beijá-lo em publico, negava suas mãos em contato com as minhas. Domesticava seus gestos exagerados.

Tive uma lembrança súbita do implante de orelha. Estava tudo resolvido, encontraria um rosto novo e seríamos felizes para sempre.

Saí no cair da noite a procura de um galalau. Encontrei um tipo italiano com nariz afinado, olhos grandes e amendoados, uma boca bem traçada. Eu tinha que ser rápida, abatia a presa com um golpe na cabeça. Achei que ele não tinha morrido de primeira, acertei-o outra vez por garantia. Destaquei a face e colei. Casei dois meses depois.

2 comentários:

. V disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
. V disse...
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