sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Pedro gostava de ir ao cinema. Adorava o Almodóvar, só por que tinha o mesmo nome que o seu, ficou sendo seu apelido. Passava horas na internet burlando a lei para nutrir seu vício.

Trabalhava numa gráfica em que xerocava tudo ao contrário. Seu chefe passava a tarde tentando explicar como mexer no papel. Permanecia no emprego pela sorte de ter o chefe como cunhado.

Augusto era casado com Genalva, mas tinha revistas impróprias no banheiro. Foi tamanho o espanto de Pedro ao abrir o armário perto da pia, e encontrar a Mônica Veloso estampada na capa, com a cadeira lhe tapando o mínimo. Desde então Augusto passou a mimá-lo, aumentou até o salário. O silêncio sempre lhe foi lucrativo.

Todas as tardes antes de ir ao trabalho, Pedro passava em frente à locadora para ver quais eram os filmes que não conhecia, Por tantas vezes cruzar pela mesma porta, deu de cara com a graça da balconista. Apaixonou-se pela idéia dela saber o nome de todos os filmes. Gostava de chamá-la por Sofia Loren, sem que ela percebesse ou manifestasse reação.

Genalva aparecia no final de semana, com um embrulho de pão de cebola, exibindo o orgulho de quem mesma o fizera. Sentava no sofá florido da sala e punha-se a falar; dizia que Augusto desfiava elogios todos os dias. Mal sabia ela do armário da pia do trabalho.

Durante a noite de domingo Pedro abusava da boa vontade da irmã. Havia escolhido alguns filmes para assistir. Depositava os pés na cadeira de plástico, estrategicamente posicionada, e pedia para Genalva ir fazer a pipoca, trocar o filme, aumentar o volume.

Em um domingo chuvoso, Genalva notou um olhar diferente no irmão. Seus olhos caídos emudeceram a preocupada fala. Com muita cautela, Genalva perguntou o que havia acontecido, ele respondeu: Sofia Loren, Sofia Loren; e saiu pela porta sem dizer para onde iria.

Pedro estranhamente trocou o elevador pela escada, assustando o porteiro ao sair pela porta que nunca se abria. Foi até a locadora para encontrar sua protagonista predileta, Ele havia decidido alugar um filme, deixando de lado a pirataria.

Chegou à loja, entrou sem aparentar nervosismo. Percorreu os olhos pelas prateleiras com os olhos luzindo. Por um segundo sua memória foi para bem distante, nos tempos de criança, quando assistia Aladim nos feriados de chuva. A nostalgia cessou quando a luz faltou, uma voz masculina veio acudi-lo na escuridão. Sem saber o que fazer, disfarçou, ligou para casa e disse: Genalva vem me buscar que estou odiando este lugar! Estou na locadora da esquina, mas não vejo nem mesmo a maçaneta.

Passado o vexame, Pedro quase dormia deitado no tapete manchado da sala. O interfone tocou, Genalva foi atender e pediu que alguém subisse, exclamando lá de dentro da cozinha que uma amiga viria ver o último filme do domingo. Sem saber quem viria Pedro nem arrumou os cabelos.

Genalva abriu a porta acendendo a luz, dando dois beijos de bochecha, apresentando a amiga como Penélope. A fotofobia impediu que ele a reconhecesse de imediato. Era sua Sofia, que o abandonara na escuridão com os clássicos. Mal pode acreditar que seu nome era Penélope. Passou a chamá-la de Penélope Cruz, a queridinha do Almodóvar. Ficaram os apelidos entre os chamegos de domingo à tarde.

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